terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Jogo de Poker

Um frio nocturno.
Uma cave, num ambiente soturno...

Olhamo-nos os jogadores:
Ali um, esfaimado e cheio de dores,
Ali outro, farto, um ar triunfante...

Colocam-se a blind e a ante...

Sobre o feltro verde as cartas premonizam:
“Dinheiro! Dinheiro!", enquanto deslizam...

Suster a respiração,
Parar o coração.
Criar uma imobilidade
Para não contar a verdade
Que nas regras vem ditada:
Ou se apostam estas cartas, ou não se ganha nada...

E então começa:
Num puro teatro, pura peça,
Chovem moedas, fichas e meteoritos,
Verdades, mentiras e mitos.

Uns desistem e não levam nada,
Uns mentem à descarada,
Outros não mostram a verdade guardada
E outros esperam a sorte noutra cartada...

Finalmente somos só tu e eu,
E no clímax do jogo, no apogeu,
Apostas tudo! Mulher, filhos e enteado!
(Claramente puseste demasiado.)
Mas eu vejo para além desse jogo
E por isso me interrogo:
“Terás o que quer que seja?
Alguma coisa que se veja?”
Respondo-me: “Não! Não tens nada!
Isso é tudo treta pegada!
As tuas cartas valem zero!
Estás precisamente onde quero!”
-“Eu cubro!” Ouves a minha sina,
Que cedo se torna a tua ruína...
"Pago para ver,
Já podes parar de tremer."

Ao início estavas à frente,
Mas não foste inteligente.
Disseste que a sorte me podia ajudar
E perdeste o teu lugar.
Bati-te!
Dei-te uma bad beat!
A sorte foi fundamental?
Sim, mas tu jogaste mal!

Assim é o jogo: quando estás a apostar,
Não te esqueças que te podes arruinar
Se a jogada for perdida.
Mas o poker é como a vida:
Se queres ter um fartote,
Tens de pôr alguma coisa no pote!


13/01/2009

sábado, 13 de dezembro de 2008

Aparência

O céu está carregado
E a chuva flui como um rio.
Sinto-me assustado
Com este tempo sombrio.
Sinto um vulto atrás de mim,
Negro, coberto por uma capa,
Um rosto impenetrável e ruim
Através da neblina que o tapa.
Eu, imóvel, quieto,
Espero algum acontecimento.
Contudo, parece-me certo
Que me caias no esquecimento.
A tua silhueta é feia, sem beleza.
Ao pé de tal monstro sinto-me belo.
Mas não sinto dó nem avareza
Neste julgamento que revelo...

Mas eis então que levantas a cabeça
E me olhas sem anúncio de medo.
Vais assegurar-te que eu conheça
Um pouco do teu segredo.
Puxas para trás o capuz
E mostras a tua face:
Eis que onde só chovia agora raia luz!
Esperas que um momento passe...
...No teu rosto agora a chuva se espalha
E o Sol nela cria um claro reflexo.
Vejo agora o seu desenho, sem falha,
E torno-me perplexo.
Agora sinto em mim o monstro e em ti a bela,
Sinto-me a chuva, quando me precipito,
E urjo como ela,
Assim a julgar, aflito...

Não existe uma segunda oportunidade
Para uma primeira impressão,
Mas nem sempre a primeira verdade
É a que nos traz a razão.
Ela só nos dá a liberdade
De criarmos uma ilusão...


13/12/2008

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Murmúrio intelectual

Quis aprender uma lição
E explorei a minha inteligência,
Fui ao mais profundo da minha razão
E procurei com muita paciência.
“É fácil”, enganado presumi eu.
“Basta que outro te ensine como se faz!”
Mas que estúpido! Que erro o meu,
Julgar que assim seria capaz!
É verdade que já é muito saber fazer,
Mas é preciso mais, íntima sapiência,
É preciso sentir na pele, compreender,
Para possuir esse pedaço de inteligência.
Os outros podem ajudar, sim,
Mas sou eu que tenho de pensar e filosofar.
Só gastando tempo, só assim,
Chega a minha compreensão a algum lugar…

Perdeste-te na penumbra do teu ser?
Outra vez, filosofar.
Não sabes o que fazer?
Voltar atrás, divagar…

19/11/2008

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Queixinhas

-Senhor Doutor,
Tenho aqui uma dor!
-Então? Conte-me lá…
-Dê-me um remédio! Já!
-Bem, vamos lá ver o que se passa,
Que essa berraria já está a perder a graça…
...Sente estas cócegas no pé?
-Ai Dr., é grave, não é?
-E esta martelada na perna?
-Ai Dr., já vejo luz no fundo da caverna!
-Vou palpar-lhe a barriga.
-Ai Dr., eu até sinto a lombriga!
-E dói-lhe a cabeça?
-Muito, Dr.! E não é nada que eu mereça!
-Que assim seja...
E o que deseja?
-Dê-me um atestado!
Já viu o meu triste estado?!
-Já, sim…então e vinho?
-Ah! Só um bocadinho…
-Pois…e a dieta, é equilibrada?
Ou não passa sem comer nada?
-Ah! Um prego no pão
É almoço, dia sim, dia não…
-E exercício?
-Ai Dr.! Que sacrifício!...

-Olhe, vá mas é daqui para fora!
Desapareça! Vá-se embora,
Que essa sua cantiga
Não é nada minha amiga!
Deixe-se de tretas e vá à sua rotina
Que eu estou aqui para praticar Medicina!
E não leva remédios nem poções,
Porque você é uma de duas opções:
Ou é um grande mentiroso,
Ou um hipocondríaco muito nervoso!
Vá mas é para outro lugar,
Onde alguém o possa aturar,
E dê-se por contente,
Que você está tudo, menos doente!


05/11/2008

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Na faca

“Mestre, ‘tás na faca!”,
Dizes tu e com razão.
“Há uma lâmina que te ataca.”
Sim, estranha sensação.
Pois, é verdade…
Maldito este fado,
Trouxe-me para aqui sem piedade,
Sem aviso, desequilibrado.
Não sei como até aqui vim
(Suponho que por causa de mim).
Estou bem no cume,
Bem no gume!

Devo cair para um lado
(E estar em cima da faca dói),
Mas em qualquer um fico desamparado
(E a lâmina pouco a pouco me corrói).
Devo escolher uma solução
E seguir em frente,
Saltar do fio para o chão,
De cabeça erguida, resolutamente!
O problema é saber para onde tender,
Decidir o que fazer, inequivocamente.
Mas cada dia me sinto enfraquecer,
E assim continuo equilibrado, pendente…

Sondo a minha razão
E ela não me consola.
Sondo então o coração
E ele ainda mais me desola.
Na faca continuo no fio
E pergunto então ao vazio…
…”Que seja o que aconteça,
Atira-te de cabeça!”…
Não me diz para desistir,
Mas também não me dá nada bonito.
E é então que me decido, deixo-me ir…
Fecho os olhos, respiro…E caio no infinito…


21/08/2008

sábado, 5 de julho de 2008

Férias

(este agregado de versos foi colocado aqui meramente com o objectivo de "moralizar as hostes")


Sento-me (na secretária) a estudar
E inclino para baixo a cabeça.
Tenho de ler, marrar e trabalhar
Para que no exame de nada me esqueça.
É sem dúvida grande o trabalho,
Sem dúvida que custa a preparação,
Mas tenho de demonstrar o que valho
No momento da próxima avaliação.

Sento-me (no parapeito) a observar
E inclino para fora a cabeça.
Sonho com férias noutro lugar,
À espera que o Sol apareça.
É sem dúvida grande a esperança,
Sem dúvida que tudo o que desejo
É nada mais que a mudança
De tudo o que agora vejo.

Sento-me (na praia) à beira-mar
E inclino para tás a cabeça.
Inalo aquele Sol e aquele ar
À espera que nada aconteça.
Foi sem dúvida um ano cansado
(Sem dúvida que o estudo é duro),
Mas cheguei ao meu desejado fado,
Cheguei ao meu desejado futuro.

Agora que paro a cabeça
E tenho perante mim todo o mar,
Sei que não há nada que me aborreça,
Sei que não há mais perfeito lugar.


05/07/2008

domingo, 22 de junho de 2008

Corrazão

O meu intelecto é um ser cheio,
Mas partido em dois, desfeito.
Uma parte está na cabeça e é seu recheio,
A outra inclina para a esquerda no centro do peito.
A cada história, cada problema,
Ele faz-me o negro favor
De o bifurcar num dilema,
De duplicar o terror.
Cada uma das partes luta pela supremacia,
Quer mandar no meu ser,
Batalha contra a outra pela hegemonia,
Quando a verdade é que nenhuma deve vencer.
Bem sei que essa luta entre cada componente
É uma das constantes da vida,
É uma situação permanente,
Uma luta nunca ganha nem perdida.
Uma diz uma coisa
E outra outra coisa diz
E, por muito que oiça,
No fim nunca nenhuma explica o que fiz.

Enfim…
Não sei a que dar atenção,
Se à razão do coração
Ou se ao coração da razão.
É a minha maldição…


22/06/2008

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Ausência

É verdade,
Não tenho tido vontade
E não tenho escrito,
Tenho dito!
Já há muito que não escrevo,
Mas não lhe dêem relevo
Que, lá por não ter escrito,
Não deixei de ser erudito!
Simplesmente não me apeteceu,
Não aconteceu,
Às vezes é assim,
Só porque sim.
Não peço desculpa
Porque em nada vejo culpa.
Só não quis e não refilaram,
Não fiz e não apreciaram.

O que estou a ver
É que já estou para aqui a escrever
E estou a queixar-me tanto
Que é melhor acabar com este pranto.
Por isso despeço-me com este pretexto:
Adeus e até um próximo texto!


09/06/2008

sábado, 31 de maio de 2008

Matemática!

-Derivadas parciais!
Conjunto dos naturais!
Somatório do integral!
Derivada da exponêncial!
Espaço conexo!
Envelope convexo!
Número irracional!
π! Razão diferencial!
Gráfico semi-logarítmico!
Semi-eixo elíptico!
Formas-n!
Curva de nível em RN!
e é número imaginário!
Teorema dos Resíduos não vem no dicionário!
Teorema de Heine-Cantor!
É com cada pontada de dor!...
Será que alguém me explica
O que isto significa?

-Vá…não sejas mendigo
E ouve o que te digo:
Se queres ser esperto
E ver estas coisas bem de perto,
Então vai para o IST
Que lá é que se vê
Permanentemente
Aquela gente
Com óculos em fundo de garrafa.
Ali ninguém se safa!
Todos cantam este poema
De trás para a frente, sem problema!
Depois ainda te fazem toda a demonstração
Mesmo que digas "não!".

E no fim perguntas então:
“Para que serve toda esta coisa tão complicada?”
É a única coisa que sabes, e eles não:
Para nada!


31/05/2008

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Estacionado

Em casa sozinho
Num dia de feriado…
Cheguei ao fim do caminho.
Finalmente, posso dormir descansado…

Chego à casa onde moro
E não tenho nada para fazer.
“Nada para fazer”…adoro…
Ou então fazer o que me apetecer…
Vou deitar até derreter,
Até ficar em molho,
Dormir até esquecer,
Nunca abrir um olho…
Sorrio de alegria
Porque acabou a estrada.
Finalmente chegou o dia
Em que não tenho de fazer nada…

Entro no quarto, fecho a porta…
Fico eternamente parado, deitado, estacionado…
Pouco me importa…
É feriado…


30/05/2008